Cafeopeia

quinta-feira, agosto 08, 2013

ERRATA

Três erros nos primeiros 50 exemplares


página 13 – proveta = provecta

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“         40 – (última pauta) 


Pré lançamento, em Vassouras, RJ





quinta-feira, janeiro 26, 2006

CAFEOPEIA

CAFEOPEIA
A grande aventura do café

Contada em versos para os adultos
mas que as crianças podem ouvir

Edison Nequete e Mané do Café

O INVENTOR DO CAFE



O INVENTOR DO CAFÉ


Depois de tomar gostosa caneca
De café, interrogava Maneca:
Quem é que inventou bebida tão boa
Que, de manhãzinha, mãezinha coa?
Dá melhor sabor ao pão com manteiga,
Realça a torrada crocante, meiga,
Adoça ainda mais o pão com mel!
Invento de ganhar Prêmio Nobel!
Eis o que propõe tio Adamastor:
Pesquisa-se quem foi o inventor.
Será que a História registou seu nome
Ou o perdeu no tempo que carcome
Memória, sem sequer deixar vestígio,
Olvidando-se o autor de tal prodígio?
Adamastor e sobrinho Maneca
(Dois ratos a roer em biblioteca)
Roeram e roeram alfarrábios,
Aprendendo de tudo. Quase sábios
E doutos... mas, do café, nada!
Não havia prova documentada.
Mas, mesmo não havendo documento,
Foi fácil superar o esquecimento,
Por um feliz achado do Maneca
Que se abraçou ao tio, gritando eureca!
Achei, meu tio, e nada tem de novo
O que eu achei! Achei na voz do povo.
Voz que vem lá de longe, do passado,
Mas actualiza sempre o seu recado.
Onde a história não chega, chega a lenda.
A lenda, afinal, é que nos desvenda
E vai contando, tim-tim-por-tim-tim,
Saga de Xadi, do princípio ao fim.
Comecemos, leitor, pelo começo,
Cuidando de lançar bom arremesso
Firme nos pés para não tropeçar
Bem, vamos ou não vamos começar?
Capital da Argélia, chamada Argel,
Erige o palco do nosso cordel
E Xadi é personagem principal.
Menino bom, distingue o bem do mal.
Defeito? Só um: não quer estudar.
Do que é que ele gosta? De duelar.
Assim, o vemos, na primeira cena,
Em duelos de espada sarracena.
Todo o dia, o pai o admoesta:
Xadi, é pouco estudo e muita festa!
O pai, que é homem de sábia docência,
Zanga-se muito; já não tem paciência.
É médico e, em altíssimo desvelo,
Sonhava ver Xadi a sucedê-lo,
Como ele sucedeu ao próprio pai
Que sucedeu ao pai do pai, do pai...
Um doutor, dois doutores, quantos mais
Na longa lista de seus ancestrais.
Medicina não quero, mas ventura
De viver plenamente em aventura.
O pai não hesitou em castigá-lo.
Xadi não esperou cantar o galo.
Para não ser assim tão castigado
Fugiu, não disse adeus, nem obrigado.
Viveu de peripécia em peripécia
Que lhe deram cartaz até na Grécia.
Uma viveu, quando caravaneiro
(Outro não havia mais altaneiro)
Teve de conduzir uma princesa,
A mais linda de toda a redondeza.
Nas infindas areias do deserto,
A caravana busca o rumo certo.
Apesar de mil-e-uma precauções
Não deixou de atrair más intenções
De um bando de ferozes assaltantes
Com seus brados de guerra altissonantes:
O troféu é o manto da donzela!
Xadi, mais lépido do que gazela,
Derrotou um por um dos meliantes
E salvou a princesa em dois instantes,
Sob forte aplauso dos caravaneiros,
Orgulhosos de serem seus parceiros.
O sultão, ao tomar conhecimento
Da façanha do grande salvamento,
Fez, de Xadi, procurador do erário-
Cargo importante no real cenário.
Cavalgando montado em elefante
Reluzia garbo o comandante.
Feitos de Xadi hoje são lembranças
Nas Oropas, na Bahia e na França.
Em meio a homenagens, rapapés,
Não ligava ter o mundo a seus pés.
Xadi só tinha os olhos para olhar
O olhar da moça preso em seu olhar.
A inveja espreitava os corredores...
E a princesa sentiu sérios temores:
Temia ver Xadi ser condenado
À morte, por ambos terem pecado.
Peço, por Deus, amor, não se arrisque...
Cuidado, que há muito diz-que-diz-que!
O que tens a fazer, Xadi? Fugir.
A tua morte estão a exigir.
Ele, que se negava a dar anuência,
Relutou, mas rendeu-se à evidência,
Não por si, mas por amor à princesa.
E do palácio saiu à francesa.
Sumiu do mapa, foi para bem longe.
Surgiu o boato que se tornara monge.
Estava era vivendo nas montanhas
Do Iêmem, entre gentes bem estranhas
Que não negaram hospitalidade.
Plantava para vender na cidade.
Criava cabras que produziam leite.
De azeitona, extraía bom azeite.
Só não era feliz, porque sofria
Do mal de amor que nunca se alivia;
Do mal de amor em sofrimento e gozo,
Mal de amor, sofrimento tão gostoso!
Tudo bem, mas um dia adoeceu:
Febre subiu, a vista escureceu.
Não havia médico, nem farmácia.
O que não lhe faltava? Perspicácia!
Perspicácia que lhe deu inspiração
De procurar em meio a plantação
Algo para fazer bebida quente...
Viu madura frutinha, felizmente,
Em arbusto de flores perfumadas
Que lembram o perfume das amadas
Dos poetas, dos homens sonhadores
Que portam ideais nos seus andores...
Do enamorado, que chora no exílio
Dorida saudade do amor caudilho...
E, no meio do desespero, espera
Libertar-se da dor que o encarcera.
Deitou à sombra da árvore, disposto
A morrer por sentir tanto desgosto.
A hora da sua morte ainda tarda-
Falou, dando-lhe pito, o anjo da guarda.
Entregou-se, então, à contemplação,
Não lhe restando qualquer outra opção.
Malgrado ainda esteja bem doente,
Xadi observa, atenciosamente,
Euforia da cabra mais andeja
Depois que se fartava da cereja
Que caía, madura, de um arbusto:
Pulava, saltava, que dava susto!
Xadi ferveu algumas sementinhas
Bebeu a infusão três manhãzinhas.
Recuperado, soube que outras gentes
Também se encontravam muito doentes.
Deu a receita: bebam este licor.
Licor bem preparado com rigor:
Secou a frutinha, torrou, fez pó,
Coou em água fervente... e foi só!
Começou sua fama de doutor
Que se espalhava já por todo o canto:
Doutor, muito mais que doutor, um santo!
Um facto crucial aconteceu:
O irmão da princesa adoeceu.
A mesma febre, o mesmo calafrio,
Dores no corpo, tontura, fastio.
O quadro ameaçava ser fatal:
A peste ronda o palácio real.
O sultão, então, quis ouvir conselho:
Como posso salvar o meu fedelho?
Um sábio da corte, consultado,
Falou assim ao pai sobressaltado:
Só há um homem, um só, que é capaz
De curar de verdade o seu rapaz.
Quem será esse ser tão poderoso?
Pago quanto queira: sou generoso.
Nome dele? Xadi! O teu proscrito.
Xadi!!! Não deixo o dito por não dito.
Que o mandem chamar. Perdoarei tudo.
Dou-lhe honrarias, ganho bem polpudo.
Ele virá, meu pai, já foi chamado.
Tapete voador traz o meu amado.
Ele virá, vai curar o meu irmão.
Em troca, dar-lhe-ás a minha mão.
Casaram... e tiveram descendência.
Vejam quanto valeu a santa essência
Extraída da frutinha vermelha
Que a uma cerejinha se assemelha.
O café, arbusto robusto, altivo,
Passou a ter no mundo o seu cultivo.
Por onde andou o café? De Seca em Meca,
Revelou nosso amiguinho Maneca.
Andou e andou, andou por léguas mil
Até plantar pé firme no Brasil.
Como diz bem o tio Adamastor:
Brasil e café, um caso de amor.
Por falar em amor, ainda resta
Descrever quão grandiosa foi a festa
Do enlace do Xadi com a princesa.
Mago Aladim manteve a luz acesa.
O padrinho foi Harum-Al-Raxide
E não permito que ninguém duvide.
Sorvete, sorvetinho e sorvetão
Não faltaram na festa que o sultão
Serviu aos convidados. Todos feitos
De café, base dos demais confeitos.
Uma torta reinava, soberana,
Preparada pela mão da sultana:
Seguindo receita de velha escrava,
O café ao damasco se mesclava.
Foram sete dias de comilança,
Sete dias de música de dança,
Tomando café, comendo iguarias
De café, sete noites, sete dias.
Acompanhe-se, agora, o doutorado
De Xadi, que resume um bom legado.
Ele, de certa forma intuitiva,
Como se intui em nossa narrativa
Antecipou achados da ciência:
Café será que influi na sonolência?
Conseguia dormir a sono solto
E despertava muito desenvolto
Apesar de, por vezes consumir
Dois cafezinhos antes de dormir.
Facto, hoje, confirmado por doutores:
Café corta mais sono aos fumadores.
Xadi, que não fumava nem bebia
(O que equivale à boa terapia)
Atingiu sadio, idade provecta,
Sem deixar jamais de cumprir a meta
Do pai: ser um médico humanitário,
Feliz, a ministrar receituário.
Fez tudo o que podia e muito mais.
Adeus, herói, muita saúde... e paz!

MEZINHAS DO CAFE



MEZINHAS DO CAFÉ

Voz do povo não se deve calar
Diz a sabedoria secular:
O café, in natura, ou infusão,
Serve para curar dores, lesão.
Muita vez, não precisa de farmácia
O bom apreciador da rubiácea.
Em verdade, café e preconceito
Estão longe de ser um par perfeito.
Café faz conviver na mesma tenda
A ciência oficial unida à lenda.
A pesquisa científica comprova
O que já foi contado em prosa e trova.
Para minorar mau gosto da azia
Vamos lembrar o que vovó fazia:
Mascava dois grãozinhos de café
E o mesmo também faz vovô Mané.
O menino, com corte que sangrava.
Sabia que a vovó do Pedro Nava
Ia café em pó por na ferida?
Sangramento estancava em seguida.
Dor de ouvido? Bastava uma gotinha
Lá dentro e acabava a dorzinha.
Dor de cabeça que não para nunca?
Folhinhas de café postas na nuca.
Café com mel, na tosse renitente,
Minora o mal, mesmo o mais resistente.
Quase queríamos passar adiante,
Mas café também vale por purgante,
Usado, às vezes, como laxativo
Unido a óleo de rícino activo.
Não falemos do café acachaçado:
Há coisa melhor para resfriado.
E outro valor mais alto se alevanta:
Café é bom parceiro da garganta.
Consta que alguns tenores e sopranos
Mantiveram a voz em altos planos
Com esta receitinha singular:
Café com manteiga faz solfejar.
Tomar café sem açúcar aplaca
O mal-estar causado por ressaca.
Curandeiro? Ninguém lhe faz favor
Ao chamar o café de SENHOR DOUTOR!

CAFE X DROGA



CAFÉ X DROGA

O que relato, não há quem desminta!
Dois sábios alemães, nos anos 30,
Drozel e Lotze, sem nenhum vacilo,
Concluíram: café mata bacilo!
Ainda acrescentaram os dois tedescos
Que é possível pinçar nos arabescos
Dele, mais um valor medicinal:
Café, desinfectante intestinal!
Nos Estados Unidos, corredor
De maratona recorre ao favor
Do café, que supre perda energética
Na super estafante prova atlética.
Mas, tem mais e mais importante até,
Saber-se que, além do mais, o café,
Embora cause certa dependência,
Conforme nos revela, agora, a ciência
Do bom doutor Darcy Roberto Lima
(Descoberta que muito nos anima):
De facto, não combina com a droga.
Tomador de café, saiba, não joga
No time perdedor dos viciados,
No qual não tem, nem terá aliados.
Ó, vício da droga, maldita voga!
Contigo, o café não dialoga.
Se depender do café, minha gente,
Ninguém da droga vira dependente!

quarta-feira, janeiro 25, 2006

CAFE E BRASIL


CAFÉ E BRASIL

Naveguemos em mar de descoberta.
Atenção, atenção, ó, gente esperta:
Como é que o café chegou ao Brasil
E, aqui, no escudo, floresceu perfil?
O café, que nos dá grande colheita,
Quem o trouxe para cá foi o Palheta
Que fora, em busca dele, na Guiana,
Um pouco mais além da Taprobana.
Ora, foi que se deu há muito tempo,
No tempo em que o café, em contratempo,
Sofria, prisioneiro, na Caiena.
Ao vice-rei do Brasil dava pena
Ver inocente, da cabeça aos pés,
Ser forçado a viver entre galés.
Então, ele deu ordem ao Palheta:
Vá, capitão, percorra este planeta.
Inspirado por Deus, não perca a fé
De trazer-nos sementes de café.
Vá libertá-las da prisão infame.
Procure comover certa madame.
Foi Palheta, cruzou mata cerrada,
À força de facão, abriu picada.
Na Guiana Francesa, que surpresa!
Encontrou, finalmente, sua presa.
Será que houve segredo de gaveta
Entre a gentil senhora e Palheta?
Ela, em troca de belos madrigais,
Cedeu sementes de seus cafezais?
Não ficou registado na imprensa
Se Palheta pediu ou não licença
Para colher frutinhas no quintal
Onde tinham prendido o cafezal.
Há duas versões muito controversas...
Uma, que malicia, nas conversas,
Ter havido entre Palheta e madame
D’Orvilliers um amável liame.
Ela era mulher do governador...
Não falta nunca algum difamador
Fazendo do facto bem inocente
Matéria de calúnia maldizente.
O facto é que, Palheta, cinquentão,
Trouxe muitas sementes, um montão!
Há outras versões da feliz chegada
Do café, nesta pátria bem amada.
Mas o café é poeta, seu doutor.
Não o tornes severo historiador.
Aqui chegou e se cobriu de flor:
Café-Brasil, história de um amor.

CAFE, DE SABA AO PARA


CAFÉ, DE SABÁ AO PARÁ

Não pretendendo fazer injustiça
Ou cometer pecado da preguiça,
Há que dizer que a lenda mais sabida,
Sobre as origens do café bebida,
Tem como palco o altiplano etíope.
Actuam Pastorzinho e Patrão Míope.
Também uma senhora muito braba
Representa: a senhora dona Cabra,
Cá, entre nós, figura capital,
Tanto quanto Pedro Álvares Cabral
Na descoberta do nosso Brasil!
Voltando-se à tarefa pastoril,
Menino magrinho estava cansado
De esfalfar-se a correr, apressado,
Atrás das cabrinhas que, enlouquecidas,
Não o deixavam vencer nas corridas.
Depois que elas comiam certa fruta
Dificultava demais a labuta
Do franzino menininho pastor
Suado, sob o sol abrasador.
Muitas, muitas cabras, ele perdia.
Tomava surra todo santo dia.
Só não apanhava mais porque corria.
Pernas, para que vos quero? – Sumia...
O patrão, cada vez mais irritado:
Que fazes, ó, rapaz apatetado?
Não tenho culpa. De quem? É das frutas.
Tornam as cabras muito mais astutas!
O Velho, que era flor de curioso.
Bisbilhotar de tudo era seu gozo.
Queria vencer o mal da velhice,
Inventar filtro que restituísse
O vigor da juventude perdida:
Um pó, uma poção, uma bebida.
Descobriria ou não o elixir?
Já chegara a pensar em desistir...
Mas foi, com esperança, até a montanha.
Veja só, que frutinha tão estranha.
As cabras as comem: não é venenosa,
Tem bom perfume, ui, que saborosa!
E o Velho Míope comeu, tanto comeu,
Que muita sede a frutinha lhe deu.
Triturou algumas, fogo acendeu.
Depois de torradas, ele as ferveu
Na água mais pura da fonte mais pura
Para um café gostoso, sem mistura.
Sentiu revigorar a sua força,
Pulou, saltou, correu como uma corça.
Ficou tão feliz, que até deu aumento
De ordenado. Com que contentamento
O menino Pastor viu que, eufórico,
O Míope não era um ser pré-histórico.
Se o velho não ganhou a juventude,
No café, encontrou a plenitude
Do viver com muito mais alegria.
Envelhecer não mais o afligia.
Anónimos, o Velho e o Menino?
Sim, o nome deles não declino...
Mas, informo, muito bem baseado,
Que o café, por lá, teve baptizado.
Café, bebida de merecimento,
Tem até certidão de nascimento!
Nome? Não é objecto de questão.
Não nasceu na China ou Indostão,
Como a velha mosca do Machado
De berço natal sempre duvidado.
Nome? O nome de sua procedência
Recorda em várias línguas, com fluência,
Ser natural de Cafa, na Abissínia,
Terra de tom roxo de glicínia...
Terra de quem encantou Salomão,
A rainha de Sabá, meu irmão...
E vale perguntar: Sabe-se lá
Se a formosa rainha de Sabá?...
Bem, chega de filtrar no coador
Tanta história e lenda, meu senhor.
Verdade é que, do reino de Sabá,
Café resolveu parar no Pará.
Parou no Pará, tomou açaí
E ficou e até falou tupi.
Por ter nascido perto de Cafa,
Ele, seu nome Café autografa
Nesta história que, por ora, termina
Depois de tão prazerosa faína
Em que, em golpe de abracadabra,
Se vê o quanto vale um pé de cabra!



Edison Nequete

REDONDILHAS DE CAFE


REDONDILHAS DE CAFÉ

O café, feito bebida
É um viciozinho ligeiro
E é também para o escritor
Um arrimo verdadeiro
Não acabaria um livro
Sem meu fiel companheiro

É desse meu bom amigo
Que, agora, passo a falar
Apesar de conhecido
Muito se tem p’ra contar
Bem merece as redondilhas
Seu passado tão invulgar

Complicado é ver as coisas
P’ra sempre se transformando
Por ser preciso um começo
As lendas vão-se criando
Lavoisier que desculpe
O que eu vou contar, cantando

REDONDILHAS DE CAFE (continuaçao)


Teve, o Café, seu começo
Quando o arcanjo Gabriel
Lançou pr’ó chão da Abissínia
U’a semente, do farnel

Que ele trazia, esquecida
De um pomar que há lá no Céu

E foi seguindo o seu fado
De semente abençoada
Até aos dias que hoje correm
Já, em tantas, transformada
A dar azo a muita história
Ora clara, ora velada

Conta-se que Abgail
Cinco medidas de um grão
Deu, torradas, a David
Uns dizem que tal ração
Tratava-se do café
Nem lentilhas, nem feijão

Balkis, rainha do povo
De Sabá, país de Kaffa

Levou para Salomão
A planta que cura estafa
O Sábio fez-lhe um menino
Assim, conseguiu sua safa

Balkis voltou à Abissínia
Sem tristeza ou pessimismo
Com Menelique, seu filho

Lá, implantou o Judaísmo
Onde veio a transformar-se
No Copta Cristianismo

Por inveja e por ganância
Esaú queria o direito
De ter a progenitura
Logo, arquitectou um jeito

Pagou Jacó com café
A Bíblia narra esse feito

Helena, aquela de Tróia
Viu Telêmaco em tristeza
Deu-lhe café e a alegria
Fez o gáudio da princesa

E aos soldados espartanos
O café dava esperteza

Gabriel, o nosso arcanjo
A pedido do Alto Alá
Deu uma planta a Maomé
Que dela fez o qahwah
A bebida estimulante
Para, ao Islamismo, ajudar

Mas o café deu-lhe forças
Não só p’ra religião
Gabava-se Maomé
Quarenta, jogava ao chão
Ou mulheres, ou inimigos
Há registo no Corão

A lenda mais conhecida
Que passo a cantar, aqui
Conta então que algumas cabras

Do jovem pastor Khaldi
Ao comerem certos frutos
Não conseguiam dormir

Pastor Khaldi, muito esperto

Ao reparar em tal facto
Foi ao mosteiro de Chéodet
Disse a um monge, estupefacto
Que também se impressionou
Com a proeza de tal mato

O monge, de curioso
Fez, co’o mato, experiência
Chás de folhas e de frutos
E, com toda a paciência

Descobriu que essa infusão
Afastava a sonolência

Os muçulmanos que tomam
Café, no Verão, ou Inverno

Acreditam que, chegada
A hora do Sono Eterno
Se têm café no estômago
Não é temido o Inferno

Ali ibm Omar al Shadhilly
Conhecido por Omar
Que com a filha de um vizir

Começou a namorar
Para salvar a sua pele
Em Moka, foi-se exilar

Nesse tempo, em que vivia

Com sua esperança perdida
Atacou uma moléstia
Ainda desconhecida
Que deixava toda a gente
Cabisbaixa e combalida

Mas um pássaro encantado
Do povo, se apiedou
Chamou pelo amigo Omar
E bom caminho, indicou
De um cafeeiro e, com ele
Omar, o povo curou

Até a filha do vizir
Do mesmo mal padecia
Ficou o pai desesperado
Ele, a tudo, recorria

Não havia medicina
Para a filha que sofria

O vizir soube de Omar
Mandou chamá-lo, ligeiro
Omar curou sua amada
Co’o remédio milagreiro

Hoje, ele além de ser santo
Do café, é o padroeiro

Os peregrinos que, a Meca
Acorriam, aos manguais
Tinham, no café, a moeda
Preferida, entre as demais
Para utilizar na troca

Por produtos orientais

Dos escravos sudaneses
O café era alimento
Comiam-no, ainda em casca
Para obterem sustento
A eles, deve o café
Também, seu enobrecimento


Nas mezinhas, Avicena
Nome cristão de Abu idn Sina
Nunca desprezava a planta
Que lhe dava a cafeína
Ele é o Príncipe dos Médicos

Orgulho da Medicina

Prosper Alpino contou
Da viagem ao Egipto
Que no Império Otomano
O café era feito um mito
A bebida mais bebida
Assim ele tem escrito


Baba Budam foi à Meca
Sete sementes guardou
Escondidas no amuleto
E, em Mysore, ele as plantou
O café, em Chikamalgur
Na Índia, frutificou

E a sementinha querida

Foi seguindo na sua senda
Deu uma volta inteira ao mundo
Num rastro de muita lenda
Quem quiser que conte outra
Que estude muito, que aprenda


Se quiser fazer amigos
Dê café como oferenda

A LINGUA DO CAFE



A LÍNGUA DO CAFÉ

Foi lá por mil, seiscentos… dezasseis
Com os caminhos marítimos abertos
Já mais nada era longe, tudo, perto
Que atinou-se o interesse do holandês
P’ra o valor do café. Tanto ele fez
Que venceu numa grande emulação
O francês, o italiano e o alemão
Via Moka, levaram para a Holanda
O que nunca se viu naquela banda
Em estufas, na fria Amsterdão

Foi então que o francês, por um desvio
Lançou mão do café e lá em Dijon
Replantou ao ar livre e não foi bom
Bem merece um apupo e um assobio
Essa planta é do quente e não do frio!
Mas preciso é errar p’ra que se aprenda
O Mercado Flandrino segue a senda
Plantam pés na colónia tropical
Indonésia, e começa o carnaval
O café a fazer jus a tanta lenda

Já na corte do rei, dito O Rei Sol
Há que tempo, o café ditava a moda
Solimão Aga, um turco da alta roda
Festas fez, com café!.. Qual um farol
Reflectindo sua luz pelo arrebol
Luís XIV era muito bajulado
Dos presentes, um foi predestinado
Em oferta das Terras Baixas, veio
Lindo pé de café de um metro e meio
Que no “Jardin des Plantes”, foi plantado

Esse pé de café tão bem cuidado
Em Paris, só servia de ornamento
Mas jamais tal caiu no esquecimento
Pois ele é o mais antigo antepassado
Dos sabidos, que foram pr’o outro lado
Desse mundo, que é o Novo, onde outra vez
Já medravam cafeeiros do holandês
Filho do de Paris, na Martinica
Neto vai pr’a Guiana, por lá fica
E, de lá, p’ró Mercado Português


Era uma vez, era uma vez, era uma vez...


E o Brasil,
o que foi que ele fez?
Ele fez o café
falar português!
Em tempo, lembramos, com os versos finais do
soneto "Pai João", de Ciro Costa
"Que os frutos do café são glóbulos vermelhos
Do sangue que correu do negro escravizado!"


ILUSTRAÇÕES:
Carmo Maciel, Luis Morgadinho e Mané do Café (originais a café)

MÚSICAS:
Mané do Café